Publicada em 19/03/2011 às 19h36m
Jeremy Laurance, do Independent LONDRES - Sete anos atrás, a morte de uma menina de 3 anos - tão gorda que teria sido "sufocada até a morte" pela própria gordura - criou uma tempestade na mídia. Ela foi apresentada como a mais jovem vítima da epidemia da obesidade em um relatório do Commons Health Comittee, do Reino Unido, e, embora tenha sido mencionada em um único parágrafo, no início do documento de 146 páginas, acabou ganhando as manchetes em todo o mundo. Autoridades queriam que o caso dela servisse de alerta para como o excesso de comida poderia, em breve, passar a matar mais pessoas do que o fumo; e como as crianças de hoje se tornariam "a primeira geração a morrer antes dos pais".
O que o comitê não sabia é que amostras de sangue da menina haviam sido enviadas do Royal London Hospital, onde ela foi tratada, para especialistas do Hospital Addenbrooke, em Cambridge, com um pedido de ajuda de diagnóstico. Eles descobriram que ela tinha um defeito genético que lhe conferia um apetite insaciável e que, por isso, seria "completamente impróprio, do ponto de vista científico", associar seu caso ao problema da obesidade infantil.
Stephen O'Rahilly, coordenador do laboratório de pesquisa em obesidade de Addenbrooke, decidiu falar sobre o caso porque, segundo ele, parecia "muito cruel" expor uma criança nas primeiras páginas dos jornais como um exemplo de como os pais "entopem seus filhos" (de comida), de tal forma que poderiam facilmente ser processados por negligência:
- Era uma acusação terrível aos pais quando sabíamos que havia um defeito genético naquela criança responsável, em 100%, por sua obesidade.
A disputa reflete uma confusão mais ampla sobre a relativa contribuição dos genes e do meio ao problema da obesidade. Qual deles determina o quanto somos gordos?
Muitos gostariam de dizer que, como a menina de 3 anos, são vítimas de seu perfil genético e nada podem fazer para combater o problema. Mas nós também somos produtos de nosso mundo.
Adotamos um estilo de vida cada vez mais urbano, centralizado em escritórios, com uma oferta de comidas altamente calóricas por um preço relativamente baixo. É o chamado ambiente obesogênico - que encoraja o excesso de comida e o comportamento sedentário. Estamos todos expostos a ele. Por que não somos todos gordos?
Numa palestra a ser proferida no Festival de Ciência de Cambridge, na próxima semana, O'Rahilly, buscará responder essa questão. Pessoas gordas, ele diz, são com frequência apontadas como glutonas, preguiçosas e estúpidas. "Coma menos e se mova mais", dizem para elas. Mas o conselho ignora a influência dos genes.
A questão-chave, segundo ele, não é por que tantas pessoas são gordas, mas por que outras permanecem magras. Como elas conseguem?
A maioria das pessoas magras é naturalmente magra. Elas não precisam lutar para ser assim, o que aponta para uma explicação genética: elas, naturalmente, têm menos apetite ou queimam calorias mais rapidamente.
- Sabemos, com certeza, que a propensão à obesidade (ou o seu oposto, a propensão à magreza) tem raízes genéticas. Cerca de 70% das variações entre as pessoas em termos de seu percentual de gordura corporal é explicado pela configuração genética, heradada de gerações anteriores - afirma o cientista. - O que o nosso trabalho mostrou é que muitos desses genes interferem, primariamente, no apetite e na saciedade. Em outras palavras, no quanto uma mesma quantidade de comida nos sacia ou nos deixa ainda com fome. E não no quão rápidamente (ou lentamente) queimamos calorias.
Existem cerca de 32 variantes genéticas que influenciam o fato de uma pessoa ser gorda ou magra já identificadas. Isoladamente, o efeito de cada gene é pequeno. Mas quando aparecem todos juntos e somados a outros fatores genéticos ainda não identificados o efeito é bastante significativo. Em outras palavras, algumas pessoas nascem para ser magras.
Para O'Rahilly, o controle da obesidade demandará crescente pressão no lado ambiental do problema, mas deve também requerer intervenções na parte biológica do problema.
- Se conseguirmos entender completamente a genética, talvez consigamos ajustá-la - afirma O'Rahilly.
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